Fagulha #04: Resistências contra Trump e Bolsonaro

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Saudações anarquistas!

Como a experiência dos anarquistas americanos na resistência contra Trump pode contribuir para as nossas ações aqui no Brasil? Camarada Danse conversa com Brian D., do CrimethInc. Ex-Workers’ Collective, sobre o coletivo, as estratégias de enfrentamento contra o fascismo, e as saídas para além da democracia.

Fiquem atentos que vamos sortear uma cópia do livro “Da democracia à liberdade: A diferença entre governo e autodeterminação”, do CrimethInc. Ex-Workers’ Collective. As instruções estão no episódio, então fiquem atentos!

#Fagulha

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Ep. #03: Educação libertária em tempos de ódio

Saudações anarquistas!

O que é educação libertária? E como os anarquistas vêem os efeitos das ações do bolsonarismo contra a educação? Camarada Danse e Rei Plebe conversam com nossos convidados Felipe Trafa, do podcast “O Quadro Negro”, e Nilo, sobre as possibilidades da educação libertária na nossa conjuntura.

 

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Músicas

La Quiete – Fiori Neri Per Ivan Illich

Crass – Do They Own Us A Living?

Eduardo – Aprendendo Com os Corpos Desfigurados

Höröyá – Griot Xamã Pajé

Libertinagem – Ato I

 

BG

La Plataforma – Guerra Civil

Zegota – Kosi Idina (So That Obstacles Are No More)

Microplatform – Milano Valencia Resistencia

 

Links

Quadro Negro Podcast ()

Fuck off Google

“Escolas nas miras das corporações da Internet”

Série de vídeos do prof. André Fonseca sobre Ivan Illich – Pt. 1: | Pt. 2: | Pt. 3: https://t.co/lOfPaOYdHD

 

Textos

Max Stirner: “O Falso Princípio da Nossa Educação

Marcio Goldman: “Formas do saber e modos do ser: Observaçõs sobre multiplicidade e ontologia no candomblé

 

Uma leitura anarquista da interseccionalidade

A palavra “interseccionalidade” têm sido utilizada com frequência em meios de Esquerda, muitas vezes sem reflexão apropriada em relação aos seus significados, e sem uma relação real com a prática diária de construção de emancipações. Atestando à incrível capacidade de Recuperação/cooptação do Capitalismo contemporâneo, o termo é amplamente utilizado em vertentes liberais do feminismo para fazer referência a uma suposta equivalência das opressões. Esse conceito é, muitas vezes, utilizado de maneira superficial e errônea – acompanhando o apagamento do protagonismo de mulheres negras e trans, e uma definição vazia de lugar de fala que é compreendida como “só eu posso falar disso”, ao invés de uma leitura materialista dos marcadores sociais da diferença. Essa discussões emergem em um momento em que a Esquerda – inclusive os anarquistas – parecem mergulhados em um debate sem fim sobre “economicismo” vs. “identitarismo”. O que propomos aqui é um retorno à história do anarquismo – e, principalmente, do anarcafeminismo -, bem como a incorporação de conceitos e estratégias produzidas pelo anarquismo decolonial, para buscarmos a ressignificação (desvio?) do conceito de interseccionalidade.

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O 1º de Maio é anarquista!

Após a Guerra da Secessão nos EUA, algumas regiões daquele país passaram por um acelerado processo de industrialização que, assim como na primeira fase aqui no Brasil, se baseou na extensa exploração de mão de obra imigrante. Em Chicago, palco da Revolta de Haymarket, os operários tinham jornada de trabalho de pouco mais de 10 a até 17 horas por dia, trabalhando 6 dias por semana. Um extenso movimento de sindicalistas de intenção revolucionária foi se montando em lutas pela melhoria nas condições de trabalho. Os patrões, claro, agiram como patrões, e reagiram com medidas anti-sindicais e anti-solidariedade: demitiam e marcavam participantes; bloqueavam empregados; recrutavam fura-greves; contrataram espiões, criminosos, e segurança privada; e incitavam conflitos étnicos. Diversas organizações cresceram naquele momento; o movimento anarco-sindicalista de Chicago, composto por milhares de trabalhadores (na sua maioria imigrantes), centrava-se sobre o jornal de língua alemã “Arbeiter-Zeitung”, editado por August Spies.

O surgimento dessas organizações anarco-sindicalistas e de sindicalismo revolucionário também está relacionado ao que muitos percebiam como um esgotamento da estratégia eleitoral. Na segunda metade do século XIX, muitos socialistas foram eleitos para cargos em câmaras, mas não obtiveram nenhum sucesso pela via eleitoral. Centenas de socialistas, nos EUA, abandonaram seus partidos e rejeitaram a via eleitoral – tida como um meio para a proteção dos privilégios das classes ricas.

Em sua convenção nacional de 1884, em Chicago, a Federation of Organized Trades and Labor Unions proclamou a luta pela jornada de 8 horas como pauta central. Outros grupos reformistas, como os Knights of Labor, apoiaram a pauta, mas muitos anarquistas a consideravam amena demais. Mesmo assim, os anarco-sindicalistas de Chicago apoiaram os movimentos pela jornada de 8 horas. Em parte, isso reflete a posição sindicalista de intenção revolucionária de usar pautas reformistas para promover uma discussão mais ampla sobre trabalho, capitalismo, e revolução. A estratégia revolucionária se baseava na ideia de que operações bem sucedidas contra a polícia e a tomada dos meios de produção em centros industriais resultariam num apoio em massa dos trabalhadores, levando à revolução social. Na convenção de 1884, a Federation of Organized Trades and Labor Unions havia proclamado que, a partir de 1886, o 1º de Maio seria a data em que a jornada de 8 horas se tornaria padrão.

Quando a data se aproximou, sindicatos e organizações de trabalhadores chamaram uma greve geral. Um panfleto convocando para o ato em Chicago dizia:

-Trabalhadores às armas!
-Guerra ao Palácio, paz às choupanas, e Morte ao ÓCIO LUXURIOSO
-O sistema de salários é a causa única da miséria do Mundo. É apoiado pela classe rica, e, para destruí-lo, devemos forçá-los a trabalhar ou MORRER
-Uma libra de DINAMITE é melhor do que alqueire de URNAS
-FAÇA SUA DEMANDA DE 8 HS POR DIA com armas nas mãos para encarar os cães-de-guarda do Capital, a Polícia e as milícias, da maneira apropriada

Os anarquistas sabiam, por experiência própria, que os patrões e a Polícia jamais permitiriam que esse movimento avançasse. 10 anos antes, em uma greve de trabalhadores das ferrovias, a Polícia atirou contra os grevistas, ferindo centenas e matando dezenas. Mesmo Kropotkin, costumeiramente tido como pacifista, quando juntou-se aos anarquistas de Berna em uma marcha em 1877, levou socos-ingleses e outras armas para se defender da Polícia, e entrou em confronto nas ruas.

Em 1º de Maio de 1886, 300.000 pessoas saíram de seus postos de trabalho nos EUA, na primeira celebração do 1 de Maio na história operária. Em Chicago, 40.000 trabalhadores entraram em greve, aliando-se aos anarquistas, ouvindo discursos inflamados e se juntando em ação direta. Nos dias seguintes, os números aumentaram, mas a paz se manteve. Foi só no dia 3 de Maio de 1886 que os conflitos iniciaram, focados na McCormick Reaper Works. A polícia atacou os manifestantes, que responderam com pedras; a contra-resposta foi na base da bala. Pelo menos dois grevistas foram mortos, e o número de feridos é desconhecido.

Os anarco-sindicalistas convocaram uma reunião para o dia seguinte, 4 de Maio, no Haymarket Square, para discutir a brutalidade policial. O clima chuvoso diminuiu o número de participantes para 3.000. August Spies proferiu um discurso que o prefeito de Chicago, presente no local, diria depois não fazer nenhuma sugestão de violência. Os manifestantes estavam calmos e em ordem. Conforme o discurso ia acabando, dois detetives correram até onde estava a maioria dos policiais, dizendo que um dos oradores estava incitando os manifestantes contra a Polícia. A polícia começou a dispersar os manifestantes.

Uma bomba foi lançada contra a polícia. Ninguém sabe de onde veio a bomba.

Existem várias teorias sobre quem lançou a bomba. Alguns dizem ter sido um anarquista na multidão; outros, um agente provocador. Um policial morreu, e outros sete morreriam nos dias seguintes. Evidências posteriores sugeriram que esses sete foram vítimas das balas da própria polícia. Oito anarquistas – Albert Parsons, August Spies, Samuel Fielden, Oscar Neebe, Michael Schwab, George Engel, Adolph Fischer, e Louis Lingg – foram acusados de terem produzido e lançado a bomba, e foram presos. Desses, apenas três estavam em Haymarket no dia.

Um júri composto por patrões e seus representantes condenou Parsons, Spies, Engel, e Fisher à morte. Louis Lingg se matou na cadeia, no dia 10 de Novembro de 1887, em um ato final de rebelião, engolindo um artefato explosivo. No dia seguinte, Parsons, Spies, Engel, e Fisher foram enforcados. Nos anos seguintes, os patrões, o Estado, e a mídia organizaram uma campanha para associar o anarquismo à violência. A imagem do anarquista com uma bomba em uma mão e uma adaga em outra se formou ali, e o socialismo passou a ser considerado “anti-americano”.

No 20 de junho de 1889, a segunda Internacional Socialista, reunida em Paris, decidiu convocar anualmente uma manifestação com o objetivo de lutar pela jornada de 8 horas de trabalho. A data escolhida foi o primeiro dia de maio, como homenagem às lutas sindicais de Chicago. Em 1º de maio de 1891, uma manifestação no norte de França foi dispersada pela polícia, resultando na morte de dez manifestantes. No mesmo ano, Errico Malatesta retornou para a Itália e organizou uma manifestação em memória aos Mártires de Haymarket. Milhares de anarquistas se juntaram às manifestações; o chefe de polícia diria que “a chegada da Federazione Anarchica estimulou imediatamente a excitação da massa”. Galileo Palla, que havia sido exilado com Malatesta na Argentina, tomou o palanque naquela tarde e incitou a multidão a se revoltar, proferindo “lunga vita alla rivoluzione”. Os confrontos com a polícia se estenderiam por toda a noite e por toda a cidade de Roma.

A história do 1º de Maio é também uma história de disputa de narrativas. Em 1894, em Cleveland, o prefeito decretou um feriado, em uma tentativa de esvaziar a luta. O presidente da AFL, um sindicato pelego, apoiou a iniciativa. Durante a década de 1890, diversas tentativas ocorreriam de organizar atos do 1º de Maio no Brasil, quase sempre frustradas ou reprimidas por prisões. Por aqui o Estado rapidamente tentou esvaziar o 1º de Maio em sua radicalidade: em 1902, um projeto foi enviado para a Câmara dos Deputados que tornaria o 1 de Maio feriado nacional. O discurso da imprensa muda imediatamente; publicou-se no Diário da Tarde, de Curitiba, em 1902:

Cônscios de que representavam uma força poderosa, procuraram os operários unir-se, congregar-se sob a égide brilhante do amor e da paz, e, qual novos cruzados, caminham desassombradamente à conquista da Jerusalém do futuro. Para as almas exaustas de sofrimento, a esperança é o bálsamo suavizador por excelência. Aí esse anseio, esta alegria sã, que emana de todos os corações, no dia de hoje, florescidos como uma promessa de um futuro de absoluta justiça

No começo do século XX, antes do boom do anarco-sindicalismo brasileiro, ocorreram “cortejos operários” no 1º de Maio. Esses cortejos eram animados por bandas de música, com queima de fogos de artifício, o que conferia um ar festivo às comemorações operárias. Os anarquistas fariam críticas ferrenhas a esses movimentos, por considerarem que esvaziavam o aspecto de luta do 1º de Maio – prefigurando os sorteios de carro e comícios organizados pelas centrais sindicais nas décadas de 1980 e 1990. Na edição 15 do jornal anarquista “A Greve”, comentando o 1º de Maio de 1902 no RJ, lê-se: “regozijou a imprensa burguesa com o fato dos festejos do primeiro de maio assumirem um caráter francamente carnavalesco, e felicitou o operariado desta cidade por ter solenizado a significativa data de maneira tão ridícula e deprimente. Confrangeu-nos o coração vermos tantos homens servirem de instrumentos inconscientes a uma detestável mascarada”.